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A velhinha da Caxangá



A princípio, ela não chama atenção: uma velhinha quieta num ponto de ônibus. É muito magra, ligeiramente encurvada, pele alva, rosto vincado por inúmeras rugas, cabelos brancos arrumados num coque. Sempre com os ombros coberto por um xale sem estampas, veste-se como se estivesse de luto e carrega uma sombrinha escura. Quem diria que essa figura aparentemente frágil poderia deixar em pânico motoristas e pedestres nas noite caladas da Avenida Caxangá?

Antes de prosseguir com o relato medonho, cabe falar um pouco da história daquele lugar. O nome vem do Padre Francisco Pereira Lopes Caxangá que, no século XVIII, comprou terras naquela área distante do Centro do Recife e deu início a uma povoação. Em 1843, foi aberto o primeiro trecho da Avenida Caxangá – via que só recebeu calçamento na metade do século XX. Em 1966, foi alargada para se tornar uma das avenidas mais movimentadas da capital pernambucana. Com o passar dos anos, ganhou um trânsito intenso porque se tornou caminho para vários bairros como Madalena, Cordeiro, Prado, Cidade Universitária e Várzea.

Foi por volta de 1959 que a começou a se falar da personagem espantosa que circulava na Caxangá. Primeiro, ela deixou de cabelos em pé motoristas e cobradores dos ônibus elétricos da Companhia de Transportes Urbanos – a CTU (criada naquela época). Sempre em torno da meia-noite, os condutores dos chamados “ônibus bacuraus” viam a velhinha toda vestida de preto em pé numa determinada parada da avenida. Ela balançava a sombrinha num gesto largo, pedindo que o coletivo parasse.

O motorista daquele turno, é claro, atendia à solicitação e a idosa subia. Como qualquer passageira, vinha sentada e tranquila até a esquina da Rua Benfica com a Estrada dos Remédios, justamente onde começa a Avenida Visconde de Albuquerque, no bairro da Madalena. E neste local a velhinha simplesmente sumia do ônibus, sem, aparentemente, descer em nenhuma parada.

Motoristas e cobradores estranharam o fato de ninguém nunca ver aquela passageira tão conhecida desembarcar. Resolveram ficar de olho nela. E, numa das viagens, a tripulação do ônibus viu a estranha senhora desaparecer no ar. Assim, feito fumaça! Depois daquele susto, a velha continuou a acenar com a sombrinha todas as noites, na mesma parada da Caxangá. Só que os motoristas nunca mais atenderam ao apelo da idosa sinistra. Quando a enxergavam, apenas se benziam e pisavam fundo no acelerador. Se a velha desistiu de assombrar ônibus, não se sabe. Atualmente pode até ser mais fácil ela comprar um cartão do BRT e esperar pacientemente numa das estações com paredes de vidro.

Mas se sabe que a danada tem outra maneira de atormentar os viventes. Quem se arrisca a andar a pé durante, à noite, nas calçadas da Avenida Caxangá também pode ter um encontro com a aparição. Dizem que, até hoje, ela aborda os passantes, principalmente em frente à igreja de São Sebastião. Prefere os rapazes que voltam tarde para casa depois do trabalho ou da faculdade. Pede para que eles a ajudem a carregar uma pesada sacola de listras coloridas, dessas usadas para levar as compras feitas em feiras livres. Quem com boa educação não faria uma gentileza dessas?

Mas, depois de alguns passos, a mulher evapora na escuridão. Basta o bem intencionado se distrair. A vítima da idosa espectral fica com a sacola nas mãos e, geralmente, resolve abri-la, curioso para saber o que faz tanto volume. Descobre que nela estão ossos humanos, uma caveira, velas e, às vezes, uma mortalha: a roupa que antigamente era vestida nos defuntos quando iam ser enterrados. Cruz credo!

 

 

 

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